Solidariedade

Amor e dedicação: idosa reforma e doa bonecas para crianças carentes em Feira de Santana

O trabalho de reforma das bonecas exige muita paciência e também tudo é feito nos pequenos detalhes. A maioria das bonecas chega a sua casa praticamente destroçada e há muitos passos até chegar ao resultado final.

19/07/2017 às 11h07, Por Rachel Pinto

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Rachel Pinto

A casa de Dona Luiza Morais Pires tem um encanto diferente e uma luz própria. Sua recepção carinhosa e seu abraço caloroso demonstram a força e a energia dos seus 84 anos de idade e já fazem o visitante se sentir em casa e muito confortável.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

Fomos em busca da sua história, saber sobre sua vida, seu trabalho voluntário de reformar bonecas e doar para crianças carentes e  acabamos sendo presenteados com um lindo exemplo de vida, solidariedade e amor ao próximo. Muito lúcida e atenta, ela revelou aos poucos o seu universo mágico das bonecas, os detalhes que são feitos por suas mãozinhas de pele fina e todos os sentimentos bons que carrega em seu coração.

Há cinco anos Dona Luiza decidiu começar a consertar bonecas para doar para crianças carentes e de lá pra cá já passaram por suas mãos cerca de 600 bonecas de todos os tipos. Com seis filhos, dez netos e uma bisneta ela conta que sempre atuou em campanhas de doação de cobertores, travesseiros e certo dia recebeu de uma vizinha um travesseiro para reformar e também duas bonecas velhas.

“Quando essas bonecas chegaram aqui estavam muito feias e velhas. Estavam todas sujas e aí eu pensei: Deixa eu dar uma arrumadinha nelas. Depois que eu costurei e arrumei, entreguei para um amigo que doou para menininhas carentes. De lá para cá não pararam de chegar bonecas eu já recebi muitas doações de várias pessoas e de vários lugares”, disse.

O trabalho de recuperação

Dona Luiza explica que o trabalho de reforma das bonecas exige muita paciência e também tudo é feito nos pequenos detalhes. A maioria das bonecas chega a sua casa praticamente destroçada e há muitos passos até chegar ao resultado final.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

Tudo começa com a lavagem da boneca com bastante sabão e alvejante. Tem que esfregar muito e ficar de molho para que fiquem bem limpinhas. Depois vem a lavagem do cabelo com xampu e o truque do amaciante para que os cabelos fiquem macios. Assim elas são colocadas para secar e depois de enxutas começa o processo de costura e arrumação. Mesmo com a visão um pouco cansada e já acometida por um glaucoma, Dona Luiza parte para a máquina de costura e refaz todo o corpinho das bonecas que tem o enchimento de tecido. Aí começa a confecção das roupas e o trabalho de acabamento final. Com muito empenho logo as bonecas vão adquirindo identidade e aumentando a coleção.

“Muitas chegam aqui muito acabadas e com o cabelo todo embaraçado. Eu lavo e coloco amaciante no cabelo.Depois desse trabalho de limpeza das bonecas eu vou costurar as roupinhas. Faço as saias, blusas e vestidos em tricot e coloco os acabamentos com rendas e fitas. Faço os sapatinhos também, coloco os laços no cabelo, brincos, pinto as unhas e de repente todas estão lindas e novinhas. Também costuro calcinhas para todas. Elas são chiques, viu?”, enfatiza

Infância de muitas brincadeiras

Conversando sobre as bonecas Dona Luiza relembra também fatos da sua infância e fala com muita alegria e saudade que foi uma criança que brincou muito e também teve a oportunidade de ter algumas bonecas. Quando menina, depois que soltava, colocava palhas para as vacas e varria o curral da propriedade da família, sua distração era pegar a caixa de bonecas e assim brincar muito durante muitas tardes.

“Eu adorava brincar. Eu me empenhava a semana inteira nos estudos e nas atividades da casa para que meus pais deixassem que eu no domingo pudesse brincar com uma amiga que morava próximo. Eu soltava as vacas correndo e ia logo pegar minha caixa de bonecas”, recorda.

Doação

Todas as bonecas recuperadas por Dona Luiza são reunidas para doação em dois períodos do ano. Antes do Dia das Crianças e antes do Natal. O objetivo segundo ela é proporcionar alegria para as crianças que não têm oportunidade nem condições financeiras de ter brinquedos. Ela já participou de alguns momentos de entrega das bonecas e fala que a sensação é de muita emoção. Além de crianças, muitas idosas que nunca brincaram na vida pedem uma bonequinha a Dona Luiza, e o pedido segundo ela não pode ser recusado em hipótese alguma.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

“Eu vou recuperando as bonecas e juntando para entregar as crianças de creches e orfanatos no período do Dia das Crianças e do Natal. Na minha porta também chega muita criança pedindo uma boneca e eu sempre dou. No posto de saúde também, que fica aqui em frente, no dia que tem pediatra vem muita criança e eu vou lá levar. É uma emoção muito grande e eu me sinto realizada em ver uma menina brincar com uma boneca dessas. Um dia, uma senhora que é mais velha que eu e que nunca brincou de boneca quando era menina me pediu uma boneca e eu mandei. É uma alegria tão grande que eu não tenho nem palavras para explicar”, ressalta.

Momentos difíceis longe das bonecas

Só algo muito sério pode separar Dona Luiza do seu trabalho com as bonecas. Ela explica que sempre conversa com todas e as enxerga como as suas companheiras de vida e de caminhada. “Eu sempre estou com elas e não sossego enquanto tem boneca para consertar. Às vezes eu me pego sem querer conversando com elas e até pergunto e aí: Você gostou da roupinha que eu fiz? Elas são minhas amiguinhas estão comigo em todos os momentos”, acrescenta.

No entanto, no final do ano passado, um grande susto fez Dona Luíza interromper o seu trabalho de reforma das bonecas. Diagnosticada com uma infecção grave ela ficou internada por 41 dias em Salvador e assim teve que deixar para trás as suas amigas para cuidar da saúde. A família que nunca viu Dona Luiza se abater com as adversidades ficou muito apreensiva e todos se uniram em correntes de orações e boas energias para que sua saúde fosse restabelecida.

“Eu estive muito doente no final do ano passado. Eu tinha febre que não passava, fiquei internada e fui para UTI. Fiquei com muitas saudades das minhas bonecas e até achei que eu não ia mais consertar nenhuma. Mas, minha força veio de Deus e da vontade de continuar meu trabalho. Tem uma bonequinha dessas que meus filhos levaram para o hospital e ela ficou comigo enquanto eu estive internada. Ela é minha companheira e vive em minha cama. Essa é a única que eu não doei. Minha filha pediu que eu não a colocasse para doação e ela está aqui comigo me ajudando”, observa.

Após receber alta do hospital e voltar para a casa a grande alegria foi rever os familiares e também suas pequenas companheiras. O período de recuperação foi lento e em seguida lhe bateu um desânimo. Não conseguia reformar as bonecas e por vários dias as olhava sem coragem de começar o trabalho.

“Minha família dizia assim: Luiza só vai estar boa quando pegar nas bonecas. Pois eu ficava olhando para as bonecas, olhava, olhava e não tinha coragem de fazer nada. Estava ainda com as mãos duras e quando foi um dia eu disse assim: Olha, quer saber de uma coisa, é hoje que eu vou costurar minhas bonecas. Aí eu fui liguei a máquina e comecei. Hoje já estou fazendo direitinho”, afirma.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

Todos na corrente do bem

O exemplo de Dona Luiza e contagia quem está por perto dela. Seu incentivo em ter solidariedade e ajudar ao próximo foi passado para os filhos, netos e também para a bisneta Duda de seis anos. Toda a família é engajada em campanhas solidárias e sobre a importância de estender a mão a quem precisa. Ela tem um filho que mora no Maranhão que trabalha de forma voluntária com reciclagem de objetos doar para famílias que precisam. Uma filha que mora na Bahia também é voluntária em um grupo de doadores de medula óssea e assim a corrente do bem a cada dia vai agregando mais familiares e amigos.

A pequena Duda adora visitar a casa da bisavó Luiza e sabe que todas as bonecas que estão ali têm um destino muito importante na vida de crianças carentes.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

“Ela vem sempre aqui e também brinca com as bonecas. Mas, já sabe que elas são para doar e fazer a alegria de menininhas que muitas vezes não tem oportunidade de brincar”, diz Dona Luiza.

Já Roberta Pires, que é neta da “super reformadora” de bonecas e mãe de Duda, comenta que a história da avó representa para ela muito amor e muita luz.

“Minha vó é um ser iluminado. Ela é muito preciosa. Não só por fazer o bem, mas por fazer parte de nossas vidas. Ela é nossa jóia”, diz emocionada.

Além da família, Dona Luiza também conta com a ajuda de algumas amigas para fazer as roupinhas e arrumar os cabelos das bonecas. Os filhos também ajudam na compra dos materiais como fitas, linhas e tecidos.

Dia a dia com as bonecas

A rotina de Dona Luiza começa bem cedo com as bonecas e para as bonecas. Diabética, ela já acorda medindo a glicemia, se alimentando de forma regrada e tomando os seus medicamentos. Depois disso começa a trabalhar e assim vai se passando o seu dia. Com problemas ósseos e algumas limitações, frutos de uma fratura há anos atrás de uma vértebra na coluna, nada lhe abate e Dona Luiza não para quieta.

Além da mente lúcida e ativa ela faz questão de mostrar sua flexibilidade levantando seguidas vezes do sofá e explica que o a fisioterapia tem lhe ajudado muito. Duas vezes por semana um fisioterapeuta vai à sua casa para realizar diversos exercícios e como aluna aplicada e determinada que é, ela faz questão de seguir tudo bem certinho.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

Para maior segurança e no intuito de evitar quedas a casa de Dona Luiza é adaptada com diversos equipamentos de acessibilidade e há também a presença de uma senhora que é sua acompanhante, lhe ajuda a realizar as tarefas diárias e volta e meia também é sua assistente no trabalho com as bonecas.

“Tem uma moça que mora comigo. Ele me ajuda muito em tudo e muitas vezes quando eu preciso costurar e não estou enxergando para colocar a linha ela vai e coloca pra mim. É uma unha de boneca para pintar, um brinco para colocar, tudo ela me ajuda. Meus filhos e netos também estão sempre por aqui e eu também vou muito à casa delas. Gosto daqui, aqui é o meu cantinho que eu moro há mais de 20 anos”, salienta.

O lelê da Luiza

Com tantas histórias, o tempo na casa de Dona Luiza passa rápido. A conversa é muito prazerosa e ela faz questão que seja regada a bolo e doces feitos por suas mãos. Não dá pra sair de lá sem experimentar o doce caseiro de jaca, nem o doce de abacaxi. Esses são especialmente feitos para as visitas e há também o bolinho light de banana, aveia e canela. Tudo muito gostoso, com sabor de abraço e carinho de vó.

Foto: Rachel Pinto/Acorda Cidade

E como se não bastasse tanto encantamento, Dona Luiza conta que todos os anos, na última semana de setembro todos aqueles que de alguma forma colaboram com o seu projeto de recuperação das bonecas são convidados para participar do “Lelê da Luiza”. Neste evento, acontece a festa das bonecas antes de saírem para a doação do Dia das Crianças e todos os amigos e familiares participam da confraternização que é regada a lelê de fubá e milho, mingaus e outras delícias feitas pelas mãos ainda muito firmes e fortes de Luiza.

Sobre solidariedade ela opina e afirma que as pessoas precisam se sensibilizar mais com as questões e necessidades do próximo e começar a fazer coisas boas.

“Vejo muita gente por aí que não faz nada por ninguém. Se as pessoas se unissem mais em prol das outras com certeza ficariam mais fortes e solidárias”, reflete.

Mesmo pequenina e com as limitações na idade Dona Luiza é muito contundente em suas opiniões e determinada na forma de agir. Assim como seu nome, ela é luz, é cheia de glória e mostra que força e luta não tem idade. Qualquer um pode também começar ajudar ao próximo agora e já.

 

Para doar bonecas para Dona Luiza entre em contato pelo telefone: (75) 991339870.

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