Bahia

Centro de Referência LGBT de Salvador fez mais de 600 atendimentos em um ano

Somente no primeiro trimestre deste ano, foram 90 atendimentos, fora os casos registrados durante o período de carnaval.

25/03/2017 às 15h46, Por Maylla Nunes

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Agência Brasil – Com um ano de funcionamento, o Centro Municipal de Referência LGBT de Salvador já fez 641 atendimentos a pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT). A informação foi divulgada pela Secretaria Municipal de Reparação (Semur) – que coordena as atividades do centro. Segundo entre os casos atendidos, há situações de violência e discriminação. Entre pessoas transgêneros, há também pedidos de orientação para alterar o nome e fazer cirurgia de mudança de sexo. Somente no primeiro trimestre deste ano, foram 90 atendimentos, fora os casos registrados durante o período de carnaval.

A Bahia é o segundo estado brasileiro onde mais houve assassinatos de pessoas LGBT em 2016. O dado está em levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia. O relatório foi coordenado pelo antropólogo e fundador do grupo, Luiz Mott. Segundo o estudo, 32 pessoas foram assassinadas na Bahia em 2016, por motivações de homofobia. O número só é menor que do estado de São Paulo, onde houve 49 casos de mesma natureza.

O antropólogo Luiz Mott ressalta, no entanto, que São Paulo tem uma população cerca de três vezes maior que a da Bahia. “Nós fazemos esse levantamento há 37 anos e nos últimos anos a Bahia vem se destacando negativamente, nesse crime de ódio que não se justifica”, diz o antropólogo Luiz Mott.

Subnotificação

O relatório levou em conta relatos de mortes de pessoas LBGT em matérias jornalísticas, além de relatos pessoais. Por isso, Luiz Mott considera que as ocorrências podem estar subnotificadas, já que muitas vezes a motivação do crime não é revelada, ou as famílias omitem a sexualidade das vítimas, movidas por vergonha ou preconceito. Além disso, Mott acrescenta que há uma lacuna no que diz respeito aos direitos da população LGBT e no registro de casos de homofobia, porque o Brasil não dispõe de um banco oficial de dados que poderiam auxiliar no desenvolvimento de políticas de enfrentamento aos crimes de ódio.

De acordo com o relatório, os estados do Rio de Janeiro e Amazonas vêm em seguida no ranking, com 30 e 28 assassinatos de pessoas LGBT, respectivamente. Os dados mostram ainda que o estado de Roraima, no entanto, não registrou nenhum homicídio dessa natureza, mesmo depois ter ter liderado a lista, em 2014, quando a taxa no estado era de 6,14 pessoas LGBT assassinadas para cada 1 milhão de habitantes.

Entre as capitais, a cidade de Manaus apresenta o maior número de assassinatos motivados por homofobia (25), seguida de Salvador (17) e São Paulo (13). Ao todo, 168 municípios brasileiros registraram esse tipo de crime, em 2016, totalizando 343 pessoas LGBT assassinadas por conta da sexualidade.

Para Mott, trabalhar as questões relacionadas à sexualidade e à identidade de gênero nas escolas seria uma medida importante para diminuir o bullying e a homofobia. Para reduzir os crimes contra pessoas LGBT, ele também defende a aprovação de leis que equiparem a homofobia ao racismo, mais políticas públicas voltadas para essa parcela da população, policiamento em locais de grande concentração de pessoas LGBT e “que as pessoas vítimas de homofobia e violência não se calem, e denunciem qualquer tipo de ocorrência”.

Perfil das vítimas e impunidade

Segundo o estudo, 32% das vítimas, em todo o país, tinham entre 19 e 30 anos. Os menores de 18 anos equivalem a cerca de 20% do total de mortos no país por homofobia. Os idosos foram 7,2% do total.

De todo o universo de pessoas LGBT assassinadas devido à condição sexual, os gays foram a maioria (50%), enquanto as pessoas transexuais foram mais de 40% das vítimas.

Beth Dantas é integrante do grupo Famílias Pela Diversidade, na Bahia, e relata a dificuldade de entender o que motiva o preconceito e os crimes de ódio. Para ela, mesmo com debates, conversas e análises de casos não há explicações para a discriminação contra o diferente. O resultado do relatório foi descrito como “decepcionante”.

“Nós. como familiares de pessoas LGBT, temos mães e pais que passaram por processos dolorosos de aceitação, mas quando a gente vê que ainda por orientação sexual ou identidade de gênero, a pessoa é assassinada por preconceito, é muito doloroso, a gente não consegue compreender a dimensão dessa violência”, diz.

A integrante do coletivo ainda conta que o preconceito pode estar dentro da família. Em alguns casos os parentes de pessoas LGBT procuram ajuda para aceitar e lidar com a diversidade dentro do próprio lar. Ela diz que, em outros casos, é comum as pessoas se negarem a entender a situação.

“Nós trabalhamos incansavelmente no combate à intolerância e à violência, com as famílias e pais, a gente sente que ainda há uma ignorância de não saberem e não quererem saber. Existe um grande número de pessoas que se negam a abrir pra esse tipo de informação. Sentimos que estamos no caminho certo, a cada dia que acolhemos alguém e quando conseguimos reinserir algum LGBT na própria família, depois de expulso ou violentado”, afirma Beth.

Dos 343 casos de assassinatos de pessoas LGBT registrados em todo o país em 2016, apenas 60 foram solucionados, e os agressores foram identificados e presos. A falta de identificação dos criminosos, o número reduzido de processos e a impunidade fazem com que os crimes de homofobia “estimulem novos ataques”, de acordo com o relatório.

Falta de políticas públicas e dados oficiais

O presidente da Comissão da Diversidade Sexual e Enfrentamento à Homofobia da seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Filipe Garbelotto, atribui a ocorrência de casos de homofobia à “inércia do Poder Público”.

“Faltam estruturas públicas para o enfrentamento da LGBTfobia, além da falta de punição. Somente 10% dos casos são apurados, enquanto a impunidade fica em torno de 90% entre as pessoas que cometem crimes contra pessoas LGBT”, destaca o advogado.

Garbelotto ainda ressalta que as campanhas contra esse tipo de violência em grandes eventos, como carnaval, podem ajudar a amenizar a situação da comunidade LGBT, mas ainda são insuficientes para sanar o problema.

São Paulo

Com o maior número absoluto de assassinatos de pessoas LGBT (49), segundo o levantamento do Grupo Gay da Bahia, o estado de São Paulo informou, em nota, que tem atuado de forma firme no enfrentamento à discriminação e violência e também na promoção da cidadania LGBT.

O coordenador de Políticas para a Diversidade Sexual da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do estado de São Paulo, Cassio Rodrigo, destacou ainda iniciativas de apoio às pessoas LGBT, entre elas: o Registro Digital de Ocorrência, que permite o registro de casos de homofobia ou transfobia, e a rede de proteção e combate à homofobia da secretaria.

O Disque-Direitos Humanos, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, do Ministério da Justiça e Cidadania, recebe ligações gratuitas e anônimas sobre qualquer tipo de violação desses direitos, incluindo das pessoas LGBT. O serviço atende pelo número de telefone 100.

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